"Um contraste entre o que há e o que se mostra"
Analisar a forma como o jornalismo atual é proposto diante
de certas questões polêmicas é interessante para se enteder como o debate e a
opinião pública são influenciados por aquilo que é divulgado. No estudo de três
artigos científicos que explanam sobre situações que necessitam um entendimento
aprofundado é possível observar como a mídia atual brasileira age diante destes
assuntos.
Ao abordar o artigo científico de Débora Diniz sobre a
situação das crianças portadoras da paralisia cerebral grave, pode-se
correlacionar dois aspectos importantes: como o hospital Sarah acompanha essas crianças
em seu processo hospitalar-familiar e como a mídia expõe essa questão.
De acordo com Diniz, o hospital dispõe de um método inovador
na busca da melhor aceitabilidade de crianças com esse tipo de déficit,
buscando a interação entre os familiares delas com o melhor método de abordagem
e troca de experiência em conjunto.
Ainda segundo ela, a sociedade desde tempos antigos
escondiam suas maleficias, pois acreditavam que era algo irracional a estrutura
física e psíquica de um individuo, assim como também é hoje em dia, o que
caracteriza que a busca pelo método medicinal fosse tanto antigamente como nos
dias atuais ter sempre a resposta para a cura, e é deste pressuposto que ela
faz a comparação dos métodos, em suas palavras.
A proposta do grupo resgata uma prática que se assemelha,
segundo Heródoto, à medicina da antiga Babilônia – a da diagnose compartilhada
(este paralelo histórico pode ser estabelecido, mas não houve qualquer intenção
semelhante na elaboração do projeto de
funcionamento do atendimento em grupo)
Diniz, Débora
A pesquisadora ainda afirma que o processo pelo qual é
abordado as crianças não é para tratá-las, mas para vinculá-las ao processo
social, pois a alma delas são a essências da vida humana, que por ventura é
diferente da dos animais irracionais. E, então, o que nos diferenciam dos
outros animais é o fato do pensar ou de se relacionar com outros indivíduos e a
grande questão é se pessoas com o PCs, nome dado a pacientes com Paralisia
Cerebral, conseguiriam ter esse tipo de relacionamento. Para a autora do
artigo, há um vínculo sentimental entre o portador da doença e seus familiares.
Já a midiatização não promove recursos para a aceitabilidade
de pessoas com o PC, pois mistificam a idéia de que elas não seriam aceitas no
processo de pessoa física, desta forma podemos observar que nenhuma das grandes
empresas de telecomunicação nacional aborda este tema. Até hoje nenhuma
emissora fez telenovelas voltada a um personagem com essa síndrome de
encefalopatia crônica não progressiva, e a situação mais recente no âmbito
nacional foi a votação pelo direito do aborto ou não de fetos com PCs
inreversiveis, ou seja, os encéfalos de estágio mais grave, onde há pouca
pespectiva de vida.
Foi aprovado no dia 12 de abril de 2012 que o aborto nessas
condições não seria mais crime contra o direito humano, assunto bastante
comentado pela mídia, por envolver questões principalmente políticas e
religiosas, dando lugar a inúmeros debates.
Isso
afeta vários setores que lutam contra o aborto neste caso específico, que
defendem a tese que ninguém pode tirar o direito à vida, independente das
condições que estejam. A antropóloga termina defendendo sua tese afirmando:
Os corpos de crianças PCs graves são, muitas vezes,
verdadeiros acidentes da ‘natureza’, onde a dita organização prevista pela
genética que mantém a vida saudável é abalada. Os conceitos científicos, porém
também arraigados no senso comum e que tentam explicar nossa humanidade,
excluem os pacientes PCs com alto grau de comprometimento.
Diniz, Débora
Com isso vemos que tanto a medicina e a sociedade buscam
respostas que possam enfim acabar com este dilema, de acabar com o preconceito
e principalmente a falta de informação social, que poderia ser amenizada
através do papel original dos meios de comunicação e proporcionar uma melhor
visibilidade das pessoas com o PC tanto em estágios leves como os mais graves,
e tornando assim algo criterioso e não mais preconceituoso em nossa sociedade.
A ação da mídia brasileira tem grande influência sobre a
formação de uma opinião geral, de grande parte da população, sobre determinados
assuntos tidos como polêmicos. A construção desses conceitos, às vezes, não
condiz com a realidade, devido a outros fatores que influem na construção das
notícias. Questões como a situação dos pacientes PCs necessitam um
aprofundamento maior. Essas diversificações de determinados conceitos também
ocorrem em outras questões, como a homoparentalidade.
No texto de Claudia Fonseca, “Homoparentalidade: novas luzes
sobre o parentesco”, o cenário familiar é tratado e expandido, abordando todos
os fatores que possam estar envolvidos na formação familiar e na adoção
resultadas de relações homo afetivas.
O texto parte da ideia de que precisamos entender que essa
formação familiar ainda não é algo comum, e que o contato com esse pensamento
ainda é impactante na sociedade em que vivemos.
Primeiro, Fonseca expõe a dificuldade da definição legal de
família à casais homossexuais, exemplificando com o caso de um casal lésbico
americano, em que uma delas adotou a outra para que assim tivessem direitos
legais, como divisão de bens, o que até então não era possível.
O aparato legal é visto pela autora como uma necessidade das
relações homoafetivas, como forma de garantir a durabilidade dos laços de
parentesco. Hoje, em muitos países, a legislação vem evoluindo e, além de
aceitar a união de pessoas do mesmo sexo, também se molda a favor de que casais
gays possam adotar crianças ou ter sua própria através dos diversos recursos
tecnológicos e avanços da medicina.
Além disso, a autora também mostra que nessas relações
existe sim a necessidade de criar o parentesco, de procurar fatores que
contribuam para a representação da família, como a escolha dos traços genéticos
do sémen doado para inseminação artificial, para que se encaixem às
características da pessoa que não tem envolvimento na geração do embrião. Além
de outras possibilidades desenvolvidas com avanços tecnológicos e econômicos, o
que parece limitar ainda mais os casais que possam ter acesso a esses avanços.
Dessa maneira, as noções de relações afetivas e genéticas
vão se reconfigurando, enfrentando os padrões de uma “sociedade heterossexual”,
dando um novo sentido à ideologia familiar. Essa reconfiguração ainda sim é
frequentemente omitida e, em contraste à sociedade tradicional, é apresentada
como um comportamento ofensivo, errado.
Pensando o tratamento deste assunto em território nacional,
a primeira coisa que percebemos é que este não é fornecido à população de
maneira livre e um dos fatores responsáveis por isso é o processo midiático do
país. Analisando os meios de comunicação brasileiros, percebemos tais atitudes:
Omissão de fatos, conservadorismo e caracterização do gay.
A programação televisiva e radiofônica, principalmente
jornalística, não se refere a esse assunto de forma natural. É perceptível o
conservadorismo da imprensa quando o assunto tratado é homoafetividade. Não
vemos com frequência notícias relacionadas a essa parcela social e, quando são
veiculadas, são bastante contidas.
Não é questão de ser cauteloso com seu público, até porque,
a mídia tradicional em si, tem o poder de construir realidades, mas, é questão
de, de forma indireta “comunicar” sua ideologia conservadora. Isso é atribuído
principalmente ao jornalismo, que tem um grande poder de moldar e criar
perspectivas ao público que se dirige.
Em 2011 tivemos dois progressos relacionados à
homoafetividade, o primeiro, em março, foi a aprovação unânime pelo STF do
reconhecimento da união estável de casais homossexuais, tratando a união
homossexual como uma entidade familiar. Mais tarde, por uma ação judicial de um
casal lésbico encaminhado ao STF, também conquistaram o direito da união civil,
ou seja, agora poderiam casar no civil nos mesmos padrões dos casais héteros.
Esses dois acontecimentos foram sim trazidos à população
pela mídia, mas ainda sim de forma ‘cautelosa’, como por exemplo, o caso da
notícia veiculada no Jornal Nacional em outubro de 2011 sobre a legalização do
casamento gay: além da notícia ser dada no começo do jornal, pode-se perceber o
excessivo cuidado em passar as informações, em que foram “esclarecidas” por
duas vezes enquanto o repórter externo explicava o que mudaria.
Essa mídia também corre contra o agendamento de assuntos que
estejam relacionados a essa evolução, tratando esse progresso como mais uma
notícia, tão comum quanto outras. Mas, vale ressaltar que existe um diferente
tratamento se comparado aos principais meios de comunicação da radiodifusão com
os principais da telecomunicação e essa diferença vai muito além das faixas
etárias da programação.
Essas diferenças se alicerçam, na verdade, em ideologias.
Enquanto a telecomunicação expõe assuntos de maior diversidade (vale lembrar
que maior parte dos canais de TV por assinatura são transmitidos por empresas
de comunicação de outros países), a radiodifusão continua baseando-se no
conservador.
O que também
percebemos é a caracterização do gay ou “polemização” do afeto entre eles. A
mídia cria o retrato do gay através de sua programação, banaliza e estereotipa
e assim é capaz de mexer com o imaginário da massa em que se envolve.
Em novelas e seriados, o gay é apresentado em dois tipos: ou
o gay tímido e culto que “se esconde” da família, ou, o gay “purpurina”,
exibido, extravagante e folgado. Além disso, as relações afetivas são evitadas,
os casais gays se relacionam como amigos e o beijo gay seria uma afronta
social.
Enfim, a mídia brasileira ainda não aceita que a homoafetividade
é tão comum quanto à heteroafetividade e com o poder de influência que tem,
acaba disseminando, mesmo que indiretamente, este pensamento e atua em
contrariedade às ideias expostas por Claudia Fonseca, que caracteriza a homoparentalidade
como mais uma relação de parentesco como qualquer outra, que se alia a questões
políticas e culturais e que, de algum modo, desperta para acontecimentos que
vão além da família gay.
As questões que envolvem suas relações com a mídia brasileira
vão muito além do âmbito cultural e social, elas atingem camadas mais
intrínsecas da sociedade, afetando diretamente, também, os setores político e
econômico brasileiros.
O texto “Democratização inacabada: fracasso da segurança
pública” da antropóloga Alba Zaluar não fala necessariamente da co-relação da
mídia com o crescimento do número de homicídios de jovens homens entre 15 e 29
anos e do fortalecimento das instituições criminais, como órgãos detentores do
poder e capazes de sobrepor a própria Justiça, mas muitos fatores ajudam a
interseccionar o papel da mídia como forma de ativação e consolidação destes
dados e fatos.
A autora começa propondo discussões interessantes quanto ao
crescimento destas taxas de homicídios, que têm uma raiz do problema muito mais
profunda do que se aparenta. Segundo a antropóloga, a situação, inicialmente,
pode ser vista como uma relação entre os problemas macrossociais, como pobreza
e exclusão social, e os mecanismos transnacionais do crime organizado,
envolvendo principalmente o tráfico de drogas e a posse de armas de fogo.
O crime organizado ultrapassou da simples esfera da
ilegalidade, hoje em dia, envolve setores legais da economia, misturando as
ações e as fortalecendo, tornando o crime-negócio um dos maiores setores econômicos
do mundo. O tráfico pode ser considerado um dos grandes exemplos desse
problema, ele utiliza setores legais da economia para serem feitas a
distribuição e comercialização das drogas. Esse negócio transnacional envolve
outros pontos do crime, como a lavagem de dinheiro e a corrupção governamental.
Ações que cada vez mais se relacionam, diferindo com a visão social de que o
tráfico é puro reflexo da atuação do dono da boca de fumo e de seus comandados.
É uma cadeia muito mais vertiginosa e engenhosa. Algo que envolve “a corrupção
institucional, a irreverência pela lei, a ineficácia e a discriminação no
sistema de Justiça” brasileiro.
Todos esses assuntos que abrangem o crime e a violência têm
o seu início no começo da formação da sociedade brasileira, onde as questões
das violências das determinadas localidades eram relacionadas às questões
interpessoais de poder e corrupção para enriquecimento próprio. Os motivos para
os ocorridos poderiam ser considerados mais virtuosos, diante o seu cunho
social, mas nos dias de hoje, essa motivação já foi perdida e até deturpada, e
o que prejudica mais ainda essa realidade social atual é que as relações de
poder e corrupção cresceram e formaram uma espécie de clientelismo, onde grupos
se unem com troca de favores ilegais.
Retomando ao foco inicial da autora, o crescimento do número
de homicídios na população de jovens homens tem ligação ao motivo desses jovens
estarem no ponto de confronto da guerra do tráfico. Ao mesmo tempo em que eles
são os “reconhecidos” pela venda e distribuição de drogas nas ações policiais,
são eles que funcionam como soldados nos confrontos contra a polícia e facções
inimigas. Resumindo, eles são o ponto de estouro de uma guerra que envolve
muito mais do que os próprios moradores das favelas (agora, comunidades), é uma
rede que encadeia, principalmente, os grandes poderosos.
Pode-se considerar a mídia como figura responsável pela
visão que a grande população tem sobre o tráfico. O que na maioria das vezes é
transmitido, são acontecimentos fragmentados, onde não se procura um explicação
mais aprofundada do problema. A mídia, como a polícia, prioriza o relato dos
pequenos fatos e autores destes crimes.
Mas isso não ocorre por escolha própria do jornalista ou
comunicador, nem por negligência quanto aos fatos. As empresas de comunicações
são indústrias lucrativas, paradoxo da atualidade, porque elas também são
consideradas instituições sociais com autoridade moral e poder coercitivo, e
como indústrias, elas pertencem a um dono que visa o ganho de capital. E,
majoritariamente, esses grandes empresários fazem parte de uma cadeia que
abrange outros dos mais diversos setores e legalidade, onde a troca de favores
é o que domina. Assim, a corrupção social também está presente.
As mídias têm o poder de moldar opiniões e agendar os
diálogos públicos, e muitos sabem utilizar dessas “virtudes” para benefício
próprio ou de um grupo. As relações sociais são alteradas e os olhares quanto
aos problemas, ainda mais.
Equipe:
Gustavo Corado, Hotton Machado e Sâmia Laços
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